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quarta-feira, 20 de abril de 2016

Análise do relatório de impeachment pelo Plenário da Câmara dos Deputados #2

A votação da admissibilidade do processo de impedimento da Sr.ª Rousseff durou 34 horas, batendo o recorde de maior sessão da história da Câmara dos Deputados. Mas o que chocou mesmo foram as votações.

O site Tortura Nunca Mais fez um levantamento das justificativas das votações do domingo no qual a sociedade brasileira se olhou no espelho:

O gráfico foi traçado a partir da primeira motivação que os deputados apresentaram. O interessante é notar que a maioria dos parlamentares votaram por causa da família deles, ou seja, por um motivo extremamente particular e completamente descabido. Apenas 5 (cinco) votaram por causa das pedaladas, o que faz levantar a suspeita de que o argumento do "soft coup" (golpe de estado brando) não tão descabido assim, afinal, todos os brasileiros sabem que bauru sem tomate é golpe.

Não vou ignorar o fato de que o gráfico foi ordenado de forma a enfatizar o descalabro das justificativas, mas isso não afasta o fato assustador de que a esmagadora maioria não votou pelo relatório, mas pela vontade de fazer um quarto turno e de erradicar os pobres da vida política: houve votos contra a CUT, contra o MST, contra as minorias, a favor de torturadores e de fascistas. O site "The Economist" publicou uma lista sobre os motivos mais escabrosos para se apoiar o impedimento:

  • For the birthday of my granddaughter
  • For the foundations of Christianity
  • For Bruno and Felipe
  • For the Masons of Brazil
  • For rural producers, because if they don’t plant there will be neither lunch nor dinner
  • Because of the proposal that children can have sex-change procedures [while still] in school
  • To end the profitability of being unemployed or a layabout
  • For the congregation of the “Quadrangular” [an evangelical church]
  • For the aged and children
  • For an end to welfare dependency
  • For my mother Lucimar
  • For charismatic renewal
  • For Brazilian doctors
  • To put an end to CUT [the biggest Brazilian grouping of trade unions] and its no-good types
  • For the love of this country
  • For an end to the Petrobras scandal and those who profited from it
  • For the Republic of Curitiba [a Brazilian state capital; Sérgio Moro, the crusading judge leading the investigation into corruption at the state-controlled oil giant, Petrobras, hails from there]
  • In memory of my father
  • For Campo Grande [the state capital of Mato Grosso do Sul], the loveliest brunette of Brazil
  • For gun control
  • Because of the communism that threatens this country
  • For the fearless and pioneering people of the state of Rondônia
  • For BR 429 [an interstate highway]
  • For all the insurance brokers
  • For my unborn daughter Manoela
  • For my 93-year-old mother who is at home
  • In homage to my city’s founding day
  • For peace in Jerusalem
  • For the best state, Tocantins
  • For my mother, who at the moment is fighting for her life
  • For the sector that generates wealth: agribusiness
  • For my son Breno and my beloved military police of São Paulo
  • For the military of 1964 [who took control of Brazil in a coup]
  • So that we don’t become Reds like in Venezuela and North Korea
  • For my 78-year-old father who taught me the principles of the word of God
  • For Sandra, for Erica, for Vítor, for Jorge, and for my grandson who is on the way
  • For my state of São Paulo, governed for the past 20 years by honest politicians from my party
  • For my wife and my daughter, who are my principal electorate
  • As tribute to my only and true riches, my daughters
  • For an end to the “colonels” [the big landowners and rich families who effectively rule much of north and north-east Brazil]
  • For the armed forces who are now pensioners without a salary
  • In tribute to my father Roberto Jefferson [a Brazilian politician implicated in a massive political scandal in 2005]
  • For Carlos Alberto Brilhante Ustra, the Terror of Dilma [Colonel Brilhante Ustra was the chief torturer under the military dictatorship]
  • For street-dwellers who sleep on the street, are born on the street and die on the street
  • In order that no government stands against the nation of Israel
  • For science and technology
  • For my wife Mariana and daughter little Mariana
  • Against the Bolivarian dictatorship
  • For the truckers
  • For free men and morality
  • For the honour of the people of Minas Gerais [a Brazilian state]
  • For Canção Nova [a Catholic radio and television network]; for the Brazilians who live with drugs
  • For my aunt Eurides, who looked after me when I was small
  • For you, mum
  • For the libertarian traditions of Minas Gerais
  • I forgot to mention my son. For you, Paulo Henrique! Kiss!
  • For the cancer hospital
  • In tribute to the victims of BR 251 [an interstate highway]
  • To honour the flag of Minas Gerais
  • I am a leader of the majority; I am not a leader of the minority
link: http://www.economist.com/news/americas/21697095-hardly-any-federal-deputies-favour-impeachment-gave-stated-charges-their?fsrc=scn%2Ftw%2Fte%2Fbl%2Fed%2Fwhyvotetoimpeachdilmarousseff


Houve polêmica para se acertar a ordem de votação durante a semana. O gângster-geral da república Eduardo Cunha queria a princípio fazer a votação dos estados do Sul para o Norte, gerando assim um efeito manada com relação aos indecisos, uma vez que a maioria dos votos contra o impeachment está nos rincões mais pobres do país. Depois, sugeriu fazer alternado, Sul e Norte, o que na prática também geraria o efeito manada e o STF chancelou a decisão. Não há nada disposto no Regimento Interno da Câmara dos Deputados com relação à chamada dos parlamentares e somente um precedente, que foi o impedimento do Collor, no qual os votantes procederam à votação por ordem alfabética.

Brasília foi separada por um muro para separar as "torcidas organizadas". Havia expectativas de fotos aéreas das manifestações que ocorriam lá fora, mas pouquíssimas foram disponibilizadas. Apesar da Polícia afirmar que houve mais amarelinhos que vermelhinhos, as poucas fotos que existem disponível após a votação começar mostram o contrário:





O muro foi pichado:

... feito de rede de vôlei:

Equipe da República Democrática da Esplanada Oriental enfrenta a República Federativa da Esplanada Ocidental

 ...e de lugar para se tirar fotos melosas:
Relacionamento entre coxinha e mortadela choca a Família Tradicional Brasileira

Continua...

 



segunda-feira, 18 de abril de 2016

Análise do relatório de impeachment pelo Plenário da Câmara dos Deputados #1

Entre 15 e 17 de abril deste ano de 2016, o Brasil se voltou para o Plenário da Câmara dos Deputados. De um lado, o vice-presidente, cansado de ser decorativo e de não ser reconhecido por suas frases em latim, em conluio com o nada ético presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha; de outro, a presidenta Dilma Rousseff, sitiada no Palácio do Planalto, e Lula, fazendo a conversa com os movimentos sociais e negociando com parlamentares para manter sua afilhada política no poder.

Na sexta-feira, uma edição especial do Diário Oficial da União fazia uma reforma no Poder Executivo, substituindo mais de cem nomes nos órgãos públicos. A oposição acusou a movimentação de ter "desvio de finalidade"; alguns políticos de esquerda disseram se tratar de um contragolpe e outros não tocaram no assunto.

Era somente um prenúncio do que estava por vir: um verdadeiro show de horrores, taxado pela imprensa mundial como "circo" e "carnaval". Na verdade, o episódio mostrou mais uma vez um Brasil caricato: nas ruas, o número de pessoas fazendo churrasco, soltando fogos e usando camisetas de futebol da CBF mais faziam o espetáculo dantesco parecer uma final de Copa do Mundo. E foi com essa seriedade que os generais do golpe  apoiadores do impeachment tocaram o processo.

Os trabalhos na Casa-Baixa (que pode agora ser chamado de Casa-da-Baixaria) começaram às 8:55 do dia 15/04, mas os parlamentares chegaram bem antes, para se inscreverem como oradores. Quando se formava a fila, o clima ainda era de descontração entre prós e contras.


A primeira fala foi de Miguel Reale Júnior, um dos autores do pedido de impedimento (obviamente não iriam colocar aquela possuída desvairada da Janaína Paschoal para acusar -- ninguém a leva a sério).

Já naquele momento já deu para perceber que não haveria seriedade por parte de muitos. Nem o autor do pedido se furtou de fazer carnaval. O governo responderia de uma forma menos jocosa, mas também faria plaquinhas.

O autor afirmou que o golpe houve quando se sonegou que o país estava quebrado. A plaquinha do "tchau, querida" é uma provocação à forma como Lula se referia a Dilma nos grampos da PF.
O Advogado-Geral da União abriu de debates na sexta-feira, fazendo uma defesa contundente:

 
O Advogado-Geral da União fala no Plenário da Câmara

O Advogado-Geral sustentou mais uma vez, assim como fizera na Comissão Especial, que não havia crime de responsabilidade. Argumentou também que o processo era nulo por vício de competência, uma vez que surgiu claramente por causa de uma retaliação do presidente da Câmara depois que o PT afirmou que iria votar contra o arquivamento de seu processo no Conselho de Ética. Salientamos que a noção de crime no sistema brasileiro advém da noção de anterioridade, ou seja, é preciso que haja na lei uma tipificação bem clara de que aquilo que se comete é crime. Ademais, julgar de um ano para o outro uma conduta que era feita reiteradas vezes por outros governantes viola:

I - a segurança jurídica: começa-se a criar uma incerteza sobre as relações jurídicas no país, pois aquilo que era aceito como a favor da lei durante muito tempo, de uma hora para a outra, sem prévio aviso, torna-se ilegal, caracterizando direito ad hoc;

II - o princípio da igualdade, vazado no art. 5º da nossa vilipendiada Constituição, que garante por si só que o tratamento dado pelos atos administrativos de Dilma Rousseff deveriam ser dados a TODOS os governantes que cometeram as mesmas "infrações" em 2016.




Estes são apenas alguns argumentos que, ao meu ver, somam-se aos do Advogado-Geral Eduardo Cardozo para taxar esse processo como a coisa mais escabrosa que já aconteceu em nossa curta vida republicana.



segunda-feira, 21 de março de 2016

Ainda sobre a seletividade da imprensa e do Judiciário

Alguns amigos, indignados com a seletividade da imprensa e com o tratamento desumano dispensado por um juiz de primeira instância ao senhor Lula, encaminharam esta escuta de uma conversa do acusado. Infelizmente, não vi nenhum dos jornais criticados veicularem este áudio.



Neste áudio, o senhor Alberto Carlos de Almeida dá uma aula sobre o funcionamento autoritário e inquisitório da justiça e o senhor Lula afirma, em foro privado, que é inocente (a partir dos 03:53). Alguns da oposição dizem que o senhor Lula sabia da escuta, porém, dificilmente uma pessoa falaria sobre aceitar ministérios para ter foro por prerrogativa de função tendo a ciência de estar sendo escutado.

sábado, 19 de março de 2016

Suspensão da Casa Civil e Carta Aberta de Lula


A ebulição política não para. Ontem (17), saiu na imprensa que o ex-ministro Lula havia falado, em conversa com a presidenta Dilma, que o Judiciário encontrava-se acovardado. Eu nem sei se tal afirmação merece comentário, uma vez que se tratava de uma conversa particular, de cunho político e etc. Se os federais grampeassem meu telefone, afirmo que eles ouviriam coisas muito piores sobre o Judiciário do que o senhor Lula falou e isso não tem valor processual nenhum.

Ao mesmo tempo, uma coisa realmente séria vazou: o senhor Lula pediu para que conversassem com ministros do Supremo, o que pode ser considerado uma forma de influenciar o futuro julgamento. Quanto à isso, entendo que a melhor conduta a se tomar é deixar o inquérito sob responsabilidade do STF mesmo, pois assim até eles podem contradizer e se defenderem da gravação (a que ponto chegamos, a 3ª parte, os juízes, fazendo uso do contraditório e da ampla defesa) e eles são a última instância do Judiciário – vai rolar uma economia processual imensa. E penso que o argumento da violação do princípio do juiz natural não cabe, infelizmente, no caso do STF, pois eles são aqueles que guardam a Constituição, em última instância – se não forem eles a guardar, quem seria o substituto?

Uma chuva de ações foram parar nos juízes federais, pedindo uma liminar para suspender o mandato do ex-ministro Lula. Dois deles foram providos, um no DF e outro no Rio de Janeiro. Sobre o juiz federal do DF que deferiu a liminar, internautas tiraram prints de seu perfil no Facebook, e deu para perceber que ele não era nada imparcial (isso sim é violar o princípio do juiz natural)
(Fonte: Sensacionalista, que lamentavelmente está menos isento de verdade do que alguns juízes por aí. Matéria em: http://www.sensacionalista.com.br/2016/03/17/10-momentos-do-facebook-do-juiz-que-anulou-a-posse-de-lula/ )
      
A liminar desse juiz de imparcialidade duvidosa já caiu mediante recurso ao TRF-1, mas a posse continua suspensa, uma vez que há outro deferimento no Rio de Janeiro pela juiza Regina Coeli Formisano; tentei entrar em seu perfil no Facebook, mas “não foi possível se conectar” naquele momento (para outros perfis, conectava-se normalmente). No Rio Grande do Sul, o pedido foi indeferido.

A defesa entrou com vários recursos e um pedido de suspender todas esses pedidos de liminar, de forma difusa, com eficácia em todo o Brasil.
Os ministros do Supremo reagiram às conversas do senhor Lula, defendendo a instituição. Alguns mais exaltados, como o senhor Gilmar Mendes (que uma vez foi xingado de coronel pelo ex-ministro Joaquim Barbosa), foram além da defesa institucional e fizeram um pronunciamento politizado, o que me causa certa estranheza, principalmente pelo fato de que a divulgação de tal conversa do senhor Lula é inteiramente questionável e ele estava falando do Judiciário em foro privado.

Devido a tais vazamentos e à cerimônia de posse, uma meia dúzia de gato pingado fechou a Paulista. Após 39 horas, o choque resolveu tirá-los de lá com bombas de efeito moral. É engraçada a eficiência da polícia nesses casos, porque para tirarem professores não demora dez minutos. Enquanto isso, os apoiadores da situação colocaram fogo em pneus eescreveram frases do tipo “não vai ter golpe” nas rodovias do Estado de São Paulo. A BR-116 foi fechada em alguns pontos.
  
Por volta das 22 horas, o senhor Lula encaminhou uma carta aberta para se esclarecer sobre a situação e pedir justiça. A carta segue na íntegra:

“Creio nas instituições democráticas, na relação independente e harmônica entre os Poderes da República, conforme estabelecido na Constituição Federal.
Dos membros do Poder Judiciário espero, como todos os brasileiros, isenção e firmeza para distribuir a Justiça, garantir o cumprimento da lei  e o respeito inarredável ao estado de direito.

Creio também nos critérios de impessoalidade, imparcialidade e equilíbrio que norteiam os magistrados incumbidos desta nobre missão.
Por acreditar nas instituições e nas pessoas que as encarnam, recorri ao Supremo Tribunal Federal sempre que necessário, e especialmente nestas últimas semanas, para garantir direitos e prerrogativas que não me  alcançam exclusivamente, mas a cada cidadão e a toda a sociedade.

Nos oito anos em que exerci a presidência da República, por decisão soberana do povo – fonte primeira e insubstituível do exercício do poder na democracia – tive oportunidade de demonstrar apreço e respeito pelo Judiciário.

Não o fiz apenas por palavras, mas mantendo uma relação cotidiana de respeito, diálogo e cooperação; na prática, que é o critério mais justo da verdade.

Em meu governo, quando o Supremo Tribunal Federal considerou-se afrontado pela suspeita de que seu então presidente teria sido vítima de escuta telefônica, não me perdi em considerações sobre a origem ou a veracidade das evidências apresentadas.
Naquela ocasião, apresentei de pleno a resposta que me pareceu adequada para preservar a dignidade da Suprema Corte e para que as suspeitas fossem livremente investigadas e se chegasse à verdade dos fatos.

Agi daquela forma não apenas porque teriam sido expostas a intimidade e as opiniões dos interlocutores.

Agi por respeito à instituição do Judiciário e porque me pareceu também a atitude adequada diante das responsabilidades que me haviam sido confiadas pelo povo brasileiro.

Nas últimas semanas, como todos sabem, é a minha intimidade, de minha esposa e meus filhos, dos meus companheiros de trabalho que tem sido violentada por meio de vazamentos ilegais de informações que deveriam estar sob a guarda da Justiça.

Sob o manto de processos conhecidos primeiro pela imprensa e só depois pelos direta e legalmente interessados, foram praticados atos injustificáveis de violência contra minha pessoa e e minha família.

Nesta situação extrema, em que me foram subtraídos direitos fundamentais por agentes do estado, externei minha inconformidade em conversas pessoais, que jamais teriam ultrapassado os limites da confidencialidade, se não fossem expostas publicamente por uma decisão judicial que ofende a lei e o direito.

Não espero que ministros e ministras da Suprema Corte compartilhem minhas posições pessoais e políticas.
Mas não me conformo que, neste episódio, palavras extraídas ilegalmente de conversas pessoais, protegidas pelo Artigo 5o. da Constituição, tornem-se objeto de juízos derrogatórios sobre meu caráter.

Não me conformo que palavras ditas em particular sejam tratadas como ofensa pública, antes de se proceder a um exame imparcial, isento e corajoso do levantamento ilegal do sigilo das informações. Não me conformo que o juízo personalíssimo de valor se sobreponha ao direito.

Não tive acesso a grandes estudos formais, como sabem os brasileiros. Não sou doutor, letrado, jurisconsulto. Mas sei, como todo ser humano, distinguir o certo do errado; o justo do injusto.
Os tristes e vergonhosos episódios das últimas semanas não me farão descrer da instituição do Poder Judiciário. Nem me farão perder a esperança no discernimento, no equilíbrio e no senso de proporção de ministros e ministras da Suprema Corte.

Justiça, simplesmente justiça, é o que espero, para mim e para todos, na vigência plena do estado de direito democrático”.

O ex-presidente uruguaio Mujica afirmou que “Dá a impressão de que existe uma espécie de cabaré jurídico no Brasil, isso também acontece em outros países. Tem gente na Justiça que cria denúncias muito espalhafatosas, feitas sob medida para ter repercussão na imprensa. Me disseram que estão tão desesperados por encontrar qualquer coisa que desacredite o Lula, que quando o interrogaram, as perguntas foram absurdas, sobre as garrafas de vinho que tinha em casa, algo bem estranho. (...) E se alguém o prende [Lula], eu irei visitá-lo, já visitei vários amigos".

Emenda: a juiza do Rio de Janeiro que concedeu a liminar é apoiadora do impeachment e gostava de bater panelas.
http://www.sensacionalista.com.br/2016/03/18/10-noticias-da-semana-que-parecem-mas-nao-sao-do-sensacionalista/

quarta-feira, 16 de março de 2016

Depoimento de Lula à Polícia Federal na Operação Lava Jato

Highlights do Depoimento do Ex-Presidente Lula à Polícia Federal – Parte 1 e 2

O ex-presidente Lula foi conduzido coercitivamente para depor à Polícia Federal no dia 04 de março de 2016 a partir de mandado expedido pelo juiz federal Sérgio Moro. A transcrição do áudio foi disponibilizada pelos veículos de imprensa e não me pergunte sobre a legalidade da disponibilidade de tal documento, uma vez que o processo corre em sigilo de justiça.
A seguir, vou resumir alguns dos pontos importantes e outros cômicos, para que os senhores entendam o porquê esse documento é o mais porreta dos últimos anos da história brasileira. Com vocês, Luiz Inácio Lula da Silva e o Delegado de Polícia.

Instituto Lula

Primeiramente, o sr. Lula foi questionado sobre a fundação e a natureza do Instituto. Ficou patente que a matemática não é o forte tanto do sr. Lula quanto do delegado de polícia, os quais afirmaram que 15% da população havia saído da pobreza absoluta, “ou seja, ¼ da população total do Brasil”.
Afora esse pequeno pormenor, o ex-presidente informou que o Instituto se mantinha por doações sem contrapartida. Ressaltou que era apenas o presidente de honra e que não autorizava as despesas da fundação, que isso ficava a cargo do sr. Paulo Okamotto e da diretoria.

O homem foi acordado às 6 horas e precisa de café

O sr. Lula se sentiu à vontade para pegar um cafezinho por conta.
Declarante:Vou pegar um café aqui, deixa eu pegar um café.
Delegado da Polícia Federal:Isso. Se o senhor quiser, vamos ajudar, vamos colocar o cafezinho aqui mais perto da gente, para a gente também poder se servir.
Declarante:Qual era a pergunta?

Algumas vezes as declarações foram um tanto complexas de se entender...

Delegado da Polícia Federal:Há 5 anos atrás, quem tinha essa função de pedir doações a empresas em nome do Instituto Lula?
Declarante:Sempre o diretor financeiro.
Delegado da Polícia Federal:Cinco?
Declarante:Sempre o diretor financeiro.
Delegado da Polícia Federal:Quem foram os diretores financeiros nos últimos 8 anos?
Declarante:Nos últimos 8 anos, não tinha diretor financeiro nos últimos 8 anos.

Depois ele deu uma aula sobre dízimo

Delegado da Polícia Federal:É comum as empresas procurarem espontaneamente o Instituto Lula para oferecer doações?
Declarante:Não. Aliás, eu não conheço ninguém que procura ninguém espontaneamente para dar dinheiro, nem o dízimo da igreja é espontâneo, se o padre ou o pastor não pedir, meu caro, o cristão vai embora, vira as costas e não dá o dinheiro(...)

Sobre as doações ao Instituto Lula

O ex-presidente afirmou que não mexe com a parte financeira do Instituto e que, aliás, nunca tinha mexido. Aliás, se houver uma auditoria sobre quem gastou o dinheiro do supermercado, ele também fará questão de não saber quem foi:

Declarante:Nem no instituto e nem em casa eu cuido disso, em casa tem uma mulher chamada dona Marisa que cuida e no instituto tem pessoas que cuidam.
Delegado da Polícia Federal:O senhor não faz nem ideia?
Declarante:Não faço ideia.
Delegado da Polícia Federal:De quanto entra em dinheiro?
Declarante:E faço questão de não fazer ideia.

Só sei que nada sei

Vários questionamentos foram feitos pelo delegado sobre o emprego desse dinheiro e sobre as doações. Lula foi categoricamente socrático:

Delegado da Polícia Federal:Como são destinadas e aplicadas essas doações?
Declarante: Não sei.

“Aquela região do crack lá...”

Delegado da Polícia Federal:Existe algum museu sendo construído, reformado?
Declarante:Teria se o Ministério Público tivesse deixado, porque nós entramos com o pedido, o Kassab nos deu um terreno ali próximo à região da Estação da Luz, onde está fazendo... Aquela região do crack lá, a cracolândia, o Kassab nos deu o terreno que a gente queria fazer o Memorial da Democracia, o Ministério Público de São Paulo entrou com um processo e está suspenso até agora, então não tem; eu pensei em levar para a universidade, mas aí resolvi deixar lá.

G4 Entretenimentos

O senhor Lula admitiu saber que seu filho Fábio era sócio da G4 Entretenimentos, mas disse não saber como funcionava: “cada um cuida do seu nesse país”. É interessante notar que, durante todos os interrogatórios e pronunciamentos a que foi obrigado a se posicionar sobre os negócios escusos de outrem, o ex-presidente sempre procurou demonstrar apatia sobre o funcionamento dos meios da coisa, demonstrando que dá ampla autonomia a quem executa, importando-se somente com os fins. Escusou-se também no caso do  mensalão. Com relação à corrupção alheia, o seu posicionamento sempre foi o mesmo, sempre foi o do “cada um cuida do seu nesse país”. Com relação à empresa de seu filho, Lula foi novamente socrático.

Declarante:Não sei, querido.

Flex BR Tecnologia

Sobre a empresa acima citada, o presidente demonstrou pela primeira vez indignação no depoimento:

Delegado da Polícia Federal:O senhor conhece a empresa Flex BR Tecnologia Ltda.?
Declarante:Essa eu faço questão que você conheça.
Delegado da Polícia Federal:Eu não conheço.
Declarante:Eu não conheço, quero que você conheça, eu não conheço, quero que você vá conhecer.
Delegado da Polícia Federal:Por quê?
Declarante:Porque é uma peça de ficção, eu não conheço, não sei onde fica, eu sei que vocês estão investigando ela porque eu vi no relatório, Deus queira que vá muita gente da Polícia Federal lá para ver, e ver o que ela já produziu na vida.
Delegado da Polícia Federal:O senhor acha que é positivo ou negativo o que ela produz?

E ainda pediu um atestado de boa-fé

Declarante:Não, deixa vocês investigarem que é melhor. Eu só espero que depois que investigarem me deem um atestado de estar dizendo a verdade sobre cada coisa, só isso.

(...)

Declarante:Você perguntou da, da...
Delegado da Polícia Federal:Camargo Correa...
Declarante:Da Camargo Correa, eu disse que a imprensa já deu que a Camargo Correa tinha doado dinheiro para o instituto e disse que ela doou metade do que doou para o Fernando Henrique Cardoso, o restante...

Ou seja, se o Lula tem rabo preso com a Camargo Correa, o FHC também tem. É bom guardar esse fato para lembrar-nos conforme for a apuração.

Lula se preocupa com o sono de seu advogado

Declarante:[Ao delegado] Não entendi a pergunta. [Ao advogado] Dormiu pouco essa noite?
Defesa:Não, dormi bem.

E em seguida, a larica bate

E eles estavam tratando sobre as doações duvidosas de empresas para o Instituto Lula.

Declarante:O que vocês têm aqui para comer?
Delegado da Polícia Federal:Não, pode dar uma olhadinha aí, pode abrir, o que achar que é bom...
Defesa:O pior é que tem os outros todos olhando aí...
Delegado da Polícia Federal:Não, a gente tomou café, o expresidenten o fim saiu sem café e tem todo o direito aí de se alimentar.
Defesa:E pode parar se quiser.
Declarante:Eu não[,] quero só um pãozinho.
Delegado da Polícia Federal:Então vou aproveitar para pegar um cafezinho também.
Declarante:Então eu vou escolher o misto quente.
Defesa:Deveria ter pego outro.
Declarante:Não, é a mesma coisa, vou comer um misto quente... O senhor quer?
Defesa:Não, obrigado.

Mais uma vez, o senhor Lula se importa com a saúde do seu advogado. E ainda ofereceu pão de queijo pra geral.

Declarante:O senhor tomou café em casa?
Defesa:Comi alguma coisinha no caminho.
Declarante:Tem pão de queijo aqui, olha, quem quiser pão de queijo.
Delegado da Polícia Federal:Acho que trouxeram para todos.
Declarante:Não, foi para todos, não foi só pra mim.

E ainda avisou que sabe falar de boca cheia

Defesa:Está desligada, né?
Delegado da Polícia Federal:Não.
Defesa:Mas só lembrar o seguinte, continua ligado isso daqui. [advogado esperto]
Declarante:Se quiser continuar, pode continuar, eu sei falar de boca cheia.
Delegado da Polícia Federal:Não, não, eu só não quero atrapalhar o
seu café.
Declarante:Na fábrica a gente trabalhava em horário corrido, você tinha meia hora para comer, então era uma desgraça, você comia falando, então...
Defesa:Quem tirou tanta gente da miséria tem direito a comer também.
Delegado da Polícia Federal:É verdade.

Paremos para ver a última afirmação do Delegado. Ele poderia estar concordando para criar vínculos com o acusado e assim conseguir alguma declaração reveladora. No entanto, ao longo da entrevista, o delegado demonstra uma ligeira empatia com o ex-presidente, não representando tal afirmação um evento pontual. Voltarei a salientar as outras manifestações do Delegado, quando for tempestivo.

Durante o café, o advogado pergunta sobre a carta precatória do juiz Moro, que nunca chegou às mãos do senhor Lula. Caso realmente não tenha havido expedido essa precatória, a condução coercitiva do senhor Lula foi completamente desproporcional e todo o interrogatório pode ser anulado, pois meios ilícitos geram provas ilícitas (teoria da árvore dos frutos podres, ou algo do tipo), beneficiando o réu. O delegado afirmou desconhecer tal precatória, e mostrou que somente tinha o mandado de intimação encaminhado a ele, por e-mail. O Ministério Público faz uma intervenção para explicar sobre a intimação do senhor Lula, mas o advogado levanta a lebre que a precatória já havia sido cumprida, sem conhecimento do réu, o que levantava certas suspeitas na defesa.

José de Filippi Junior

O ex-presidente Lula confirmou que tinha uma relação partidária e uma boa relação pessoal com o senhor José de Filippi Junior. Confirmou que ele foi o responsável pelas doações à campanha presidencial e que havia sido diretor, podendo inclusive ter pedido doações ao Instituto Lula ao longo do ano de 2006. Afirmou que o senhor José nunca teve relação com a LILS palestras.

99% certeza. Mas aqueles 1%...

Delegado da Polícia Federal:Isso o senhor afirma com certeza?
Declarante:Tem 99% de possibilidade que ele nunca tratou disso.
Delegado da Polícia Federal:Pelo menos com a sua autorização?
Declarante:É.
Delegado da Polícia Federal:Em relação à LILS?
Declarante:Nunca, eu nunca fui fazer uma palestra a convite do Fillipi.
E ainda explicou de forma realista como funciona uma candidatura à presidência

Declarante:Deixa eu lhe falar uma coisa, um Presidente da República que se preze não discute dinheiro de campanha, se ele quiser ser presidente de fato ede direito ele não discute dinheiro de campanha.

Se é taxi ou uber, o que eu tenho a ver com isso???

Delegado da Polícia Federal:O senhor sabe se o José Fillipi costuma usar um serviço de táxi com o mesmo taxista?
Declarante:Serviço de que?
Delegado da Polícia Federal:Táxi, táxi...
Declarante:Eu não sei, querido.
Delegado da Polícia Federal:Não sabe se ele anda de táxi?
Declarante:Não sei.
Delegado da Polícia Federal:Sabe se tem algum taxista que é amigo dele?
Declarante:Não sei, não sei.
Delegado da Polícia Federal:Não?
Declarante:A nossa amizade não chega a tanto.
Delegado da Polícia Federal:Por isso que eu perguntei qual era a sua relação com ele, o senhor disse que era uma relação boa...
Declarante:Como é que eu vou saber como ele anda?

Rogério Aurélio Pimentel

O senhor Lula confirmou que o senhor Rogério era segurança da presidência, mas negou ter conhecimento de qualquer envolvimento dele com o Instituto Lula.

Paulo Cangussú André

O ex-mandatário da república confirmou que existia um menino que trabalhava com Okamotto com esse nome, que seria o responsável  para viabilizar as viagens do declarante em suas palestras. Explicou que as palestras que ficavam a cargo do Instituto Lula eram gerenciadas por ela e que a LILS se responsabilizava apenas pelo serviço em si. Em seguida, demonstra certa beligerância contra a Lava Jato e a Polícia Federal:

Delegado da Polícia Federal:E a receita dessas palestras vai para o instituto ou para a LILS?
Declarante:Ela fica na LILS e vai ser utilizada quando todas as empresas que vocês estão destruindo nesse país não puderem contribuir mais financeiramente, o dinheiro vai ser utilizado para manter o instituto.

Declarou que a senhora Clara Ant era a secretária de seus negócios, melhor dizendo, sua assessora, e que o senhor Paulo André cuidava apenas da infraestrutura.