quarta-feira, 20 de novembro de 2019

Voz!

Em uma escola que trabalhava surgiu a proposta de fazermos uma atividade de pesquisa onde os alunos fossem os protagonistas e o professor um mero mediador, a escola optou pelo design thinking1, os alunos poderiam escolher o tema e professor mediador, um grupo escolheu o tema “Dar voz as minorias” fui convidado para ser o mediador do grupo, fiquei muito honrado com o convite e também receoso, pois, é um tema sempre delicado para se trabalhar em escolas. Nossa primeira reunião foi uma bagunça todos queriam falar ao mesmo tempo, no final optaram por fazer um cartaz, de um lado com frases que eles ouviram e se sentiram ofendidos e o do outro lado o que esperavam alcançar com o projeto, logo depois do cartaz feito eles perceberam que não era “dar” voz , sim TER voz, não eram minoria, eram minorizados pela sociedade, e que não eram eles, somos nós, reconhecimento e autodeterminação foram fundamentais para o projeto. Se dividiram em três grupos de pesquisas: um pesquisaria a população negra, outro LGBTQI+ e outro as mulheres, procurariam relatos, dados estatísticos e entrevistas.

Nosso próximo passo foi decidir o que fazer com o material coletado, decidimos fazer uma exposição sensorial, eles ficaram tão chocados com as estatísticas que decidiram que todos deveriam saber,  ao reconhecerem a importância de ter voz, decidiram editar as entrevistas e produzir um documentário, foi um projeto de imersão fizemos várias saídas de campo, falamos com representantes de várias partes da sociedade, uma deputada, Secretaria da Mulher no Congresso, umbandista, coordenador de uma casa de amparo aos LGBTQI+, universitários, alunos do ensino médio, médicos, advogados... conseguimos um panorama em que pudemos constatar como esses três grupos são marginalizados socialmente, o documentário e a exposição ganharam um nome:  vozes, pelo direito de existir!

Tudo produzido e pensado por eles, cartazes, filmagens, roteiro, edição de imagens, fotos, deu um orgulho danado, o melhor foi as reação dos alunos e alunas ao verem e se verem, ao ouvirem e se ouvirem, em ver seus pais compreendendo o seu dilema social, em muitos casos foi a primeira vez que a família falava sobre o assunto, muitos termos que a comunidade escolar desconhecia, como: feminicídio, transexualidade, pessoa cisgênero, LGBTcídio, entre outros.

Recentemente nosso atual Presidente Jair Bolsonaro, questionou a importância e a necessidade dos estudos e pesquisas nas áreas de Humanidades, acho que ele deveria aprender com os meus alunos e alunas, para compreender que entre tantas coisas que poderiam mudar no mundo, uma delas seria o quadro político que temos hoje. Não vou entrar na polarização de direita e esquerda, falo de humanidade, não se horrorizar e se revoltar com a execução de uma mulher negra, que morreu por exigir o direito de voz, e de um motorista pai de um bebe de um ano, que foi alvejado de balas durante o seu trabalho. Questionar a morte de Marielle Franco e de Anderson Gomes não é ser de esquerda é ser humano.

Um pessoa que se candidata a deputado e para se promover publicamente quebra uma placa em homenagem a essa mulher negra, tem uma simbologia enorme, ele não queria quebrar a placa, ele queria calar Marielle, mesmo depois de morta. Recentemente, já eleito deputado federal, Daniel Silveira “justifica” o número de pessoas negras mortas pela polícia, suas palavras foram: “tem mais negro no crime”, ele não compreende nem a função da segurança pública, que é assegurar a vida de TODOS!

Ontem tivemos outra tentativa de homicídio a Zumbi dos Palmares, um deputado Coronel Tadel, arrancou e quebrou uma obra da exposição (Re)Existir no Brasil – Trajetórias negras brasileiras. O quadro trazia dados sobre a violência de Estado contra negros e pobres, que estava exposta no mesmo congresso onde meus alunos e alunas foram fazer parte de sua pesquisa, hoje dia 20 de novembro, é um dia de luta, não de comemoração, luta por existir, para que não sejamos mais rasgados, calados ou mortos.

Casos como esses falam tanto dos políticos quanto de nós sociedade, precisamos nos reconhecer e conhecer o outro, compreender que Direitos Humanos, não é privilégio é humanidade! Que deve se estender e salvaguardar a todos, indistintamente, entender que as diferenças existes e que devem ser respeitadas, não se trata de aceitação, trata-se de igualdade.

Então Sr. Presidente, pergunte aos meus ex-alunos e ex-alunas por que que estudar humanidades? Eles te darão uma boa aula! Pergunte a família da Marielle por que estudar Direitos Humanos? Pergunte ao cartunista Carlos Latuff, por que estudar censura? Não se preocupe as respostas são muitas e são construídas com o tempo, e pode ter certeza que nossa voz ecoará sempre!

Jefferson Alexandre

1 Design thinking: Uma maneira de pensar através do design. Ou seja, com criatividade e simplicidade, em busca de múltiplas soluções possíveis e sempre com foco nas pessoas. Muito usado por empresas para criar novos produtos ou estratégias e também para inovar, essa maneira de pensar também se aplica muito bem à área da educação porque propõe acima de tudo, construção e comunicação coletiva com empatia.  (https://educador360.com/gestao/design-thinking-na-educacao/)

Texto enviado pelo colaborador Jefferson Alexandre. Licenciado em História, atualmente o autor faz mestrado na mesma área na Universidade do Porto, em Portugal.



terça-feira, 19 de novembro de 2019

terça-feira, 12 de novembro de 2019

CONSIDERAÇÕES SOBRE O LULA LIVRE



Editorial
Após o julgamento sobre a questão da segunda instância pelo Supremo Tribunal Federal, a liberdade cantou para Lula. O ex-presidente havia sido feito prisioneiro político pelo então juiz Sérgio Moro, para evitar que ele fosse candidato à Presidência da República. Devido a uma campanha nacional e internacional pela soltura de Lula, ao desgaste do governo Bolsonaro, da imagem de Sérgio Moro e, principalmente, pela crise política que emergiu devido ao caso Vaza Jato, devido ao imenso material jornalístico de Glenn Greenwald, Lula foi beneficiado por um habeas corpus na sexta-feira e, depois, foi para São Bernardo do Campo reorganizar a sua militância.

A soltura de Lula, no entanto, não significa um “retorno” à Constituição, como se magicamente o estado de exceção generalizado que tomou conta dos país a partir de 2016 tivesse sumido com uma canetada do Supremo. Trata-se de um recuo tático da burguesia nacional e da classe política fisiológica para enquadrar Bolsonaro, uma vez que a burrice incomensurável do atual presidente da República por vezes atrapalha os interesses da mesma burguesia que o garante no poder. O que não se está claro é se a tentativa é de conter Bolsonaro ou de fortalecê-lo, uma vez que, com Lula solto, a polarização em torno do PT pode voltar a ser relevante e Bolsonaro pode se fortalecer se souber aproveitar a oportunidade (afinal, muitas alianças somente são possíveis se houver um “inimigo comum”).

No Congresso Nacional, a presença do Lula, que pode voltar ou não a ser o eixo da discussão política, tende a atrair uma parte dos políticos da direita fisiológica (conhecida como Centrão) e repelir a outra parte; dificilmente haverá indiferença com relação a Lula no jogo político. Esse fenômeno deve sufocar o crescimento do PSOL, que vem se verificado de forma lenta e gradual desde o processo de impeachment de Dilma Rousseff. A tendência é a construção de um novo “centro”, hegemonizado pelo PT e MDB, com legendas como o PSB e outros partidos de centro-direita orbitando, que polarize com a extrema-direita de Bolsonaro e asseclas. Isso representa também uma aproximação do PSDB com a extrema-direita, uma vez que a direita tradicional, que fica no meio do caminho dessa polarização, tende a se esvaziar; Rodrigo Maia, que tentava reconstruir a direita tradicional a partir da “moderação” do DEM (que era mais para a extrema-direita no início do governo), poderá sair prejudicado com a saída de Lula, a não ser que tente um acordo anti-Bolsonaro. O PSOL tende a ter uma aproximação inicial, com algumas alianças municipais fechadas com os setores mais à direita do Partido (como é o caso do Marcelo Freixo), mas tende a se afastar à esquerda devido ao sufocamento eleitoral.

No campo progressista, a soltura de Lula certamente é positiva, por se tratar de uma reparação, por retardar a sanha persecutória contra líderes da esquerda, por contrapor elementos burgueses que tentam se pintar como progressistas (como o Ciro Gomes, o qual certamente vai procurar polarizar com Lula, aproximando-se do ex-eleitorado do Bolsonaro) e, também, para pôr fim à paralisia de pauta do partido hegemônico da esquerda, o PT; por outro lado, pode alimentar ilusões institucionais em um momento no qual o avanço neoliberal sobre os trabalhadores se intensifica. Lula é o cara da conciliação, do reformismo fraco, e, em épocas de polarização, a gente sabe muito bem o que isso significa. Quando a luta de classes se radicaliza, é um erro não tomar um posicionamento mais claro contra a burguesia e a favor da classe trabalhadora. #

CurvaCAST 22 - Golpe na Bolívia e Lula Livre



Editorial
No último dia 10 de novembro, Evo Morales renunciou ao mandato de Presidente da República Plurinacional da Bolívia, após violentos protestos patrocinados pela direita e um “pedido” das Forças Armadas. Um sujeito oportunista que surgiu com o golpe é Luis Fernando Camacho, uma espécie de Bolsonaro da Bolívia, membro do “Comitê Cívico pró-Santa Cruz”, que é uma organização fascista que surgiu em Santa Cruz de la Sierra para conservar o espírito colonizador do branco boliviano, que se acha herdeiro direto do europeu, em contraposição aos povos andinos.

A clivagem entre brancos e indígenas existe nos países que foram invadidos pela Espanha através de uma lógica própria, que difere um pouco da cultura brasileira, uma vez que os indígenas participam de maneira mais direta na política dessas nações, tanto que conseguiram emplacar um presidente da República. Lá, os indígenas são franca maioria, compondo 55% da população, ao passo que os brancos são apenas 15%; o que faz a Bolívia ser tão explosiva, no entanto, é o fato que a minoria branca é a detentora da riqueza, enquanto a maioria vive na pobreza ou em uma vida modesta.

A Bolívia apresenta um enorme histórico de golpes e mandatos inconclusos (o fato do nome do prédio presidencial se chamar Palácio Quemado não é à toa). Evo foi o presidente que mais tempo conseguiu ficar no poder - a média de ocupação no cargo da presidência na história pós-Segunda Guerra da Bolívia é de dois anos e meio; Evo conseguiu se manter por treze anos, superando, inclusive, o nazista e ditador Hugo Banzer, sendo que este último, por muito tempo governou sem precisar se eleger e com forte aparato repressivo.

Evo renunciou após grupos financiados pelos Estados Unidos insuflar a população a se insurgir, devido a denúncias de supostas fraudes nas eleições que deram a vitória em primeiro turno ao presidente bolivariano; a Polícia foi a primeira organização a aderir ao golpe, enquanto as Forças Armadas se negavam a prestar apoio a Evo. Casas de políticos ligados ao Movimento al Socialismo foram incendiadas; a prefeita da cidade de Vinto, Patricia Arce Guzmán, foi agredida e humilhada em público, sendo pintada de vermelho, obrigada a andar descalça por horas e tendo seu cabelo cortado. Eventos como este demonstram o caráter fascista do levante. Camacho, quando adentrou ao Palácio Quemado, estendeu a Bíblia sobre a bandeira boliviana e começou a invocar Jesus Cristo! (lembremos que a maioria da população não é cristã!). Os presidentes do Tribunal Superior Eleitoral foram feitos reféns por homens encapuzados com o uniforme da polícia boliviana.

O interessante deste golpe é que ele vem durante uma época de maresia na economia boliviana. Duas semanas antes do acontecido, a BBC publicou um artigo, que foi reciclado após a renúncia, intitulado “O que está por trás do sucesso econômico da Bolívia da era Evo Morales?”. O conflito social emergiu por puro reacionarismo de setores da extrema-direita diante de uma “desculpa”, uma acusação de fraudar mais de 10% dos votos válidos nas eleições gerais. A Organização dos Estados Americanos, quintal oficial dos Estados Unidos, teve um importante papel na escalada dos protestos, quando decidiu adiantar o resultado de seu parecer, mesmo antes de haver concluído a auditoria, ainda que a Bolívia estivesse caminhando para um clima de pacificação, como se importasse com o timing de quem promovia os protestos. É interessante a nota à imprensa do organismo do dia 11, onde conclama a Assembleia Nacional a organizar novas eleições e, ao mesmo tempo, e mesmo com os inúmeros casos de violência contra os indígenas, coloca mais lenha na fogueira, pedindo a continuidade da investigação das fraudes, por parte da justiça boliviana, “até as últimas consequências”, adotando uma postura pouco diplomática e até mesmo intervencionista.

Grupos que apoiam Evo Morales deram um ultimato de quarenta e oito horas aos golpistas, enquanto organizavam uma marcha para La Paz. Durante o caminho, ouvia-se o brado da multidão “Ahora sí, guerra civil”, “Evo no está suelo” e “Evo vencerá”. No percurso, tropas passaram a atirar à chumbo na população, matando ao menos três pessoas, entre elas uma criança.

Os governos do México, da Rússia, da China e do Uruguai denunciaram o golpe de Estado na Bolívia; no Brasil, mesmo com a quartelada, com o ultimato das Forças Armadas e com a barbárie tomando as ruas, os jornais evitam usar a palavra “golpe” e preferem amenizar com “renúncia”. Evo Morales seguiu para o asilo político após o México lhe oferecer seu território. A Rússia mandou um recado ao Brasil através de uma nota diplomática pedindo encarecidamente para ele não se intrometer nas questões internas da Bolívia, em resposta aos vazamentos de áudio nos quais grupos camachistas e religiosos evangélicos diziam ter apoio estadunidense e de “uma pessoa muito próxima a Bolsonaro”.

O levante na Bolívia certamente inspirará grupos fascistas brasileiros a tomarem atitudes mais radicais, muito embora o apoio ao governo Bolsonaro esteja minando dia após dia. É importante ficarmos vigilantes para as pretensões autoritárias de certos “líderes” políticos e, também, vigiarmos as pretensões das lideranças evangélicas; podemos estar sob a lógica de uma nova “Cruzada” por parte deles.

Qual o sentido de propor novas eleições sem Evo Morales no atual cenário boliviano?

Artigo do colaborador Luiz Fellipe Lisbôa Mattos, membro do Núcleo Anarquista do Proletariado Revolucionário

Na Bolívia, um setor insiste em apresentar a derrubada do governo Evo Morales como o resultado político de mobilizações populares indispostas com o presidente recém destituído. Esta avaliação desconsidera os motins policiais ou os apresenta como uma tomada de partido da polícia em favor das demandas populares e contra as arbitrariedades cometidas pelo ex-presidente.

Os documentos assinados ou divulgados por essa ala esquerda do golpismo boliviano são a expressão de um projeto político de voo curto. A declaração do Comitê Cívico Nacional, impulsionado desde Chuquisaca, de que se deve convocar novas eleições para recolocar o país na rota da democracia, convida, também, o exército e as polícias a tomarem parte nessa estranha festa da liberdade da qual participam, com seus uniformes militares e bíblias, generais de alta patente, Carlos Mesa, Luis Fernando Camacho e todos os antigos apoiadores de Gonzalo Sánchez de Lozada.

Qual o sentido de propor novas eleições sem Evo Morales no atual cenário boliviano? Facilitar o acesso da direita ao poder? Fazer refluir o confronto entre golpistas e anti-golpistas com a vitória destes últimos?

Evo é acusado de covardia, mas os que o acusam querem capitular diante da ofensiva militar contra o povo e contra a democracia, mais do que isso, apoiam a ofensiva militar e um suposto papel saneador que ela cumpriria neste momento. Ora, se houver derramamento de sangue e ações vandálicas, os responsáveis são aqueles que investiram contra o governo eleito, e se a direita ocupar o poder, deve-se dizer desde agora, a violências será a marca cotidiana do novo governo, como sempre foi durante os anos de dominação da direita boliviana.

A população deve ser mobilizada para impedir que o golpe prevaleça. O exemplo da Federación de Juntas Vecinales de El Alto deve ser seguido por todos os que querem impedir a consolidação de um regime escorado no oficialato das forças armadas, William Kaliman e afins. Deve-se impulsionar, como sugere a federação, a criação dos comitês de autodefesa nos sindicatos e substituir a polícia profissional por membros das comunidades locais.

A partir da criação de organismos controlados pelo povo, pode-se, aí sim, abrir caminho para uma reforma real do poder político a partir dessas bases populares. Que esses organismos tenham vida longa dependerá da campanha política e da experiência das massas no interior da luta contra o golpe, contra os militares e contra a direita.



Os artigos publicados neste blog não necessariamente espelham a orientação política do Diplomatas de Sealand, exceto aqueles de caráter editorial. Esse espaço é cedido como uma forma de democratizar o debate político e a participação popular.



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sábado, 2 de novembro de 2019

Grupo de agentes indígenas é emboscado por madeireiras


URGENTE!
O grupo de agentes florestais indígenas “Guardiões da Floresta” foi emboscado por madeireiros hoje, 1º de novembro de 2019, no interior da Terra Indígena Araribóia, região de Bom Jesus das Selvas-MA, entre as aldeias Lagoa Comprida e Jenipapo.

Houve intenso confronto. O indígena Paulo Paulino Guajajara, o “Lobo mau”, foi assassinado com um tiro no rosto; seu corpo segue na mata, no local do crime. O líder guardião Laércio Guajajara está ferido em aldeia da região e temos informação de que um madeireiro também morreu na troca de tiros. Informações também dão conta de que os madeireiros da região de Buriticupu-MA estão nesse momento no interior do território para resgatar o corpo do criminoso.

A Funai do Maranhão, em articulação com as forças de segurança, sobretudo a PMMA, já tem homens a caminho do local. Um helicóptero da Secretaria de Segurança Pública está sendo usado na operação.

Mais informações em breve. Acompanhe pelo Mídia Índia

Toda solidariedade aos guerreiros Guajajara da TI Araribóia!