segunda-feira, 8 de outubro de 2018

Análise do Resultado das Eleições Gerais - 1.º Turno


Chega ao fim mais um emocionante, dramático e talvez o último primeiro turno de uma eleição direta da Constituição de 1988. Logo de cara, para quem estava acompanhando ao vivo as apurações, um medo: Jair Bolsonaro chegou a fazer cócegas nos 50% e o campo progressista correu o perigo de perder de forma acachapante. Agora, porém, sobra-nos a tarefa de conseguir a missão quase impossível de ultrapassá-lo no segundo turno. Mas o que me chama mais a atenção nem é tanto o quadro dramático das eleições do Executivo, mas o que indica o Legislativo.

Houve uma brutal renovação no Congresso Nacional e nas Assembleias Legislativas - brutal no sentido mais Jogos Mortais que se possa dizer: os partidos mais tradicionais da direita, como o PSDB, foram trocados pelo PSL, um partido formado basicamente por militares, policiais, pastores e lunáticos diversos. Os gerentes do coronelato (MDB e "centrão" tradicional) também viram seus nomes serem trocados pelas mais diversas denominações salvacionistas que surgiram nesses últimos tempos que se cerca o apocalipse brasileiro, com especial atenção à ascensão do PSC, Patetas, Fodemos e Partido "Nôvo". As eleições legislativas consolidaram Jair Bolsonaro como o mais novo líder de massas e o PSL como a nova sigla populista - tudo à direita dos limites do bom-senso. Os militares voltaram ao poder a partir do voto, você tem ideia do que significa isso? Significa que estamos fudidos, porque uma vez dentro, difícilmente fora - e não estou falando de reeleições não.

O empréstimo do "carisma" de Bolsonaro garantiu não só a tradicional eleição nepótica dos membros de sua família, mas também a de figuras mitológicas como Arthur Mamãe Falei, Alexandre Frota e Janaína Paschoal. O partido, minúsculo até ontem, irrelevante desde 1998, agora chega ao centro do debate fazendo 52 deputados federais, compondo a segunda maior bancada da Câmara dos Deputados, um número 52 x maior que a sua atual composição (façam as contas para entender a magnitude desse fenômeno...). No Senado também fizeram a devassa e tomaram o lugar de políticos tradicionais (Lindbergh Farias, Suplicy, Dilma Rousseff, Jorge Vianna e outros petistas foram os que mais sofreram com esse ascenso rápido dos candidatos pró-Bolsonaro). Fez o que a UDN de 1950 sempre sonhara em fazer, mas lhe faltava Whatsapp, memes e teorias de conspiração para excitar os tiozões da classe média.

Estamos testemunhando a entrada de um novo período no qual o lulismo deixa de ser o eixo da discussão e passa o bastão para o bolsonarismo (não mais Lula e Antilula, mas Bozo e Antibozo). Os conservadores não só aumentaram as cadeiras no parlamento, como aumentaram a dose de conservadorismo em cada cadeira que conquistaram. Isso significa que, mesmo que Haddad ganhe, dificilmente ele irá governar, pois com essa gente não tem conversa. Em verdade, provavelmente sequer tomará posse.

O PT errou e muito nesse primeiro turno. Comportou-se mais como advogado de defesa, do que como partido político de trabalhadores; não soube a hora de perceber a realidade da sua falta de potência, não teve a humildade para compor uma aliança secundando o PDT (sou crítico a alianças centristas, mas vivemos tempos extremos: ao menos uma frente desenvolvimentista, na falta de uma de esquerda, para fazer face ao fascismo, era necessário compor e o PT já fez alianças até com o diabo, que atualmente é presidente do Brasil graças a esse vacilo). Chegamos ao segundo turno à sombra do agonizante binômio lulismo/antilulismo, graças à falta de pragmatismo, de senso de realidade e de excesso de orgulho da ainda maior legenda do campo progressista. Este é o triste fado da esquerda brasileira, que não consegue nem compor uma chapa de DCE para fazer o enfrentamento antifascista em épocas sombrias.

O resultado não foi muito diferente do que as pesquisas prenunciavam. O Datafolha indicava Bolsonaro com até 42% e Haddad com até 27%, na vida real ficou 46% a 29%; os votos vieram da velha guarda de direita, Alckmin, Álvaro Dias e da centro-direitista-que-o-povo-acha-que-é-de-esquerda Marina (essa última terminou mais desidratada que Ramsés II mumificado), algo já esperado, pois os eleitores acharam mais seguro tentar eleger os agentes polarizadores logo no primeiro turno. Foi uma tragédia anunciada. Bem anunciada.