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sexta-feira, 22 de janeiro de 2021

A REFORMA PROTESTANTE



O movimento cristão protestante teve seu início na França, ao longo do século XIII. O início dos questionamentos à autoridade católica começou quando Pedro Valdo encomendou a tradução da Bíblia para o francês e passou a fazer pregações por conta própria, sem o sacerdócio.

Valdo era rico, de origem burguesa, e sua fortuna veio do comércio de roupas em Lyon; porém, quando da sua epifania cristã, o comerciante francês distribuiu sua riqueza, mantendo somente o suficiente para a subsistência de sua família. Amparava sua teologia a partir do Evangelho, onde se lê: "Ninguém poderá servir a dois senhores: Deus e o dinheiro" (Mt 6:24). Tentou fundar uma ordem na Igreja Católica, mas foi rechaçado, de forma que continuou a pregar por conta própria. Assim, viria a ser excomungado anos mais tarde, o que não o impediu de dar prosseguimento a sua interpretação da Bíblia. Uma ordem não católica se formou, os valdenses, que seriam perseguidos pela Igreja por três séculos.

Vários acontecimentos importantes mudaram a sorte dos valdenses e da Igreja Católica: o cativeiro do papa em Avignon, no reinado francês e o Grande Cisma do Oriente. O debate da fé atingiu as classes mais baixas. Passou-se a questionar a opulência da Igreja e seus dogmas e a demandar um retorno ao cristianismo primitivo, no qual a igreja era pobre e mais próxima de seus seguidores.

 

O marco inicial da reforma aconteceu quando Martinho Lutero afixou nos portões de Wittenberg as suas 95 teses, que são o apanhado geral de todos os questionamentos que haviam sido feitos pelos protestantes desde Valdo. Interessante, porém, é notar a mais polêmica: a doutrina do sola fides, na qual o homem poderia ser salvo somente por acreditar em Deus, independente de realizar obras boas na Terra.

Mas, afora todo o debate da fé, algo mais essencial estava ligado ao surgimento da reforma cristã: o mundo estava mudando desde as Cruzadas. O comércio havia ressurgido e a prática da usura (acumulação de riqueza) era condenada pela Igreja, apesar de ela própria, como instituição, poder praticá-la. A burguesia se incomodava das críticas ideológicas que limitavam seus vultuosos lucros e demandavam uma nova religião - uma na qual não seria pecado enriquecer além da necessidade humana. Por outro lado, a aristocracia tinha suas razões econômicas para apoiar o movimento: queria se livrar dos pesados tributos devidos ao clero e se apossar de suas terras; alguns nobres, inclusive, dependiam dessa surrupiação, ameaçados que estavam de serem extirpados com o Renascimento Comercial e a centralização absolutista.

Por essa razão, principalmente no Império Romano Germânico (atual Alemanha) a nobreza iria se apropriar das 95 teses de Lutero para apoiar e organizar os anticatólicos.

Lutero destratava dos pobres; condenava as rebeliões camponesas e apoiava a aristocracia. Sobre os famintos que se insurgiram contra os nobres, Lutero escreveu: "Contra as hordas de camponeses (...), quem puder que bata, mate ou fira, secreta ou abertamente, relembrando que não há nada mais peçonhento, prejudicial e demoníaco que um rebelde". Super cristão, não?

Mais do que uma reforma de fé, a Reforma Protestante se tornou o alicerce da ideologia burguesa: uma visão de mundo que não se importava mais com o amor ao próximo, com a justiça social, uma visão com forte teor antipopular. Ironicamente, o movimento que se iniciou com Pedro Valdo, que pregava a pobreza e a caridade, iria evoluir mais tarde para o calvinismo, fundada sobre a doutrina da prosperidade, a pedra angular da ideologia burguesa e do capitalismo moderno

sexta-feira, 1 de julho de 2016

A Criação do Universo

A maioria das construções filosóficas preocupam-se com a origem do homem, do mundo, das coisas, como premissa básica para extrair daí sua ética e sua moral. Minha proposta é diferente. Escolherei construir minha escola filosófica a partir de uma premissa que não tem nada a ver com isso e que remete muito a Descartes: a vinculação da nossa consciência com a nossa existência. Porém, tomando um caminho diverso ao que o holandês tomou, não irei aceitar a perfeição como o extremo de uma régua existente, pois isso significa negar o racionalismo; pelo contrário, vou aceitar o racionalismo como uma fonte de verdades práticas.

E, a partir disso, preferirei construir todas as minhas convicções e tirarei conclusões práticas para a vida. Portanto, adota-se a máxima fundamental: "tudo pode ter uma explicação lógica refutável". Afirmando-se isso, a ideia da existência de deus tem que ser negada, inclusive como mero ente criador, pois disso advém uma consequência lógica terrível -- a possibilidade de censura.

O pentecostal mais afoito, que bate na porta de sua casa aos domingos, tem então toda a liberdade de te perguntar (na verdade, eu acho que deveria ser crime bater na casa dos outros domingo de manhã...): "se as coisas vieram de uma grande explosão, de onde veio a explosão?". A fé determina que esse cara seria deus, mas o cético pode responder com uma interpelação: "Se for deus, quem criou deus?". A resposta mais comum é a seguinte: "ele simplesmente surgiu e não cabe a mim questionar". Com isso, dá para notar qual que é a dinâmica óbvia da fé, qual seja, a aceitação de um conceito dito por alguém que está no ramo da charlatanice há mais tempo. E o que me faz provocar ainda mais a necessidade desse deus-atômico é o seguinte: se deus surgiu do nada, ou se não cabe a nós questionar sua origem, por que não podemos simplesmente acreditar que as coisas surgiram do nada e não há utilidade prática em questionar sua origem? Por que precisa-se criar um segundo ator nesse processo de criação, cuja existência somente troca a problemática de lugar? Por isso, é melhor escolher o caminho mais difícil, mas muito mais esclarecedor, que é não acreditar na intervenção divina sobre a natureza.

A próxima pergunta a se responder é: por qual motivo uma pessoa deve escolher a racionalidade em detrimento da fé? Em primeiro lugar, a fé traz segurança e conforto, além de desabonar o indivíduo das responsabilidades sobre os problemas do mundo e, em muitos casos, retirando de si o controle da própria vida e do mundo que o cerca, trazendo a noção de "destino", de vontade divina que sobrepuja suas próprias vontades. Trata-se, na verdade, de o ser humano optar por se considerar fora do sistema de funcionamento das coisas. Já a racionalidade (verdadeira, e não a mera replicação de valores) nos traz insegurança e inquietude, porém, ao se formar uma convicção, enche-nos de confiança e autoestima; faz-nos compreender que existe um sistema de responsabilidades do qual fazemos parte e que buscar descobrir quais são essas responsabilidades é um dos estágios para a autoaceitação. E nesse processo de descoberta, percebe-se que muito tem a ver com os valores que a pessoa adota para si, quer seja um produto do meio, quer seja por construção, mas sempre através da interpretação sobre o que se percebe das coisas.
Fig.1: Porque Lou Salomé terminou com Nietzsche
A replicação é um mecanismo de falsa racionalidade. Trata-se da reprodução de um discurso, inventado por algum interlocutor geralmente com uma intenção bem definida, mas sem confrontar esse discurso com outros, procurando sempre evitar fontes que possam refutá-lo. É, portanto, um lobo em pele de cordeiro, uma fé disfarçada de racionalidade, que pode ser muito nociva para a sociedade -- o fascismo e qualquer outro tipo de fanatismo é o produto comum desse processo. As pessoas que carregam essa visão fechada de mundo, mesmo que sejam ateias, não são livres, não possuem autoconfiança, preferindo um discurso inflamado, apaixonado, do que um racional, pois têm medo de serem refutados. São mais miseráveis do que aqueles que simplesmente aceitam a fé e negam o racionalismo, pois vivem desse medo.